O contribuinte estará no campo da ilicitude se o negócio jurídico for simulado ou se as condutas esconderem, modificarem ou excluírem o fato jurídico tributário. Nesses casos, o planejamento tributário apresentado ao Fisco é inválido. Assim fixou a 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 3ª Seção de julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
No caso em análise, uma trading vendia derivados de soja no mercado interno para empresa varejista com alto saldo devedor de PIS e Cofins e que, portanto, deveria recolher essas contribuições na apuração mensal. Na prática, as mercadorias compradas da trading não passavam pelo estabelecimento da adquirente varejista. Eram remetidas para armazéns localizados no Porto de Paranaguá.
Na operação analisada, a varejista não atuava como exportadora, mas como compradora de derivados de soja (adquiridos da trading) e como revendedora desses produtos a empresas comerciais exportadoras que exportavam a mercadoria.
No voto, a relatora, conselheira Liziane Angelotti Meira, o analisar a operação, entendeu que a varejista e a trading agiram fraudulentamente, realizando atos sem motivos legítimos, e manteve a imputação de simulação e da multa no percentual de 150%.
“A autuação está fundamentada nos dispositivos legais que a regem e a descrição dos fatos conduz às situações jurídicas que desencadearam o lançamento. A narração é clara, não deixando dúvida quanto ao fato imputado, o que permitiu às empresas identificarem o fundamento da exigência fiscal. Restando o enquadramento legal e a descrição dos fatos aptos a permitir a identificação da infração imputada ao sujeito passivo, e estando presentes nos autos todos os documentos que serviram de base para a autuação sob exame, não há que se falar em nulidade”, explica.
Segundo a relatora, os créditos foram glosados, pois seria a trading quem, realizou as operações de exportação, sendo a varejista um terceiro artificialmente inserido nas operações de exportação.
“Assim, está clara a ausência de propósito negocial, diante da comprovação de que de um lado a trading buscou a diminuição do estoque de créditos e, de outro, a varejista o acúmulo de créditos, com a indevida redução de tributos”, disse.
Segundo a relatora, os contratos, depoimentos e demais documentos apresentados permitem afirmar que a trading, dentro de suas atividades normais, executa operações denominadas de “performance” junto às comerciais exportadoras. “Logo, não há fundamento para que ela faça contrato com a empresa ao invés de exportar seus produtos diretamente”, avalia.
Para a relatora, a validade do planejamento tributário é aferida após verificação de adequação da conduta no campo da licitude ou da ilicitude.
“Assim, a opção negocial do contribuinte no desempenho de suas atividades, quando não integrar qualquer hipótese de ilicitude, ou seja, implicando a ausência de subsunção do fato à norma tributária ou acarretando o enquadramento à norma tributária que prescreva exigências menos onerosas, é perfeitamente lícita. Estará o contribuinte no campo da ilicitude se o negócio jurídico for simulado ou se as condutas esconderem, modificarem ou excluírem o fato jurídico tributário”, defende.
O Caso
A fiscalização constatou, também, que a trading vende regularmente as mesmas mercadorias para as mesmas comerciais exportadoras que compraram da varejista, e concluiu que para trading não havia motivação negocial para realizar a operação.
Em vista disso, os créditos de PIS e Cofins da varejista foram glosados pois, de acordo com o fisco, seria a trading quem de fato e de direito realizou as operações de exportação.
Para a fiscalização, houve conluio entre a trading e a varejista, e as operações teriam como finalidade a transferência ficta dos créditos de PIS e Cofins para a varejista, para reduzir o pagamento de PIS e Cofins dessa empresa (que se creditava dessas contribuições ao adquirir os derivados de soja).
A trading, por sua vez, fez conluio com a varejista, pois se exportasse diretamente seu produto, continuaria acumulando créditos de PIS/COFINS e teria de se submeter a todos os requisitos legais necessários para promover o seu pedido de ressarcimento junto à Receita Federal, nessa operação a varejista ressarcia esses tributos diretamente à trading, mediante recompensa.
Acórdão nº 3301005.601.
Por Gabriela Coelho.
FONTE: Revista Consultor Jurídico – publicado em 22 de março de 2019.