Entendimento prevê alíquota de 15% a 25% para os valores transferidos.
A Receita Federal afirmou, em recente entendimento proferido na solução de consulta Cosit 309, que os valores remetidos a título de doação a residente ou domiciliado no exterior, pessoa física ou jurídica, sujeitam-se à incidência do IRRF, à alíquota de 15% ou de 25%.
Veja a ementa:
ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA RETIDO NA FONTE – IRRF EMENTA: REMESSAS PARA O EXTERIOR. DOAÇÃO. INCIDÊNCIA. Os valores remetidos a título de doação a residente ou domiciliado no exterior, pessoa física ou jurídica, sujeitam-se à incidência do IRRF, à alíquota de 15% (quinze por cento), ou de 25% (vinte e cinco por cento), na hipótese de o beneficiário ser residente ou domiciliado em país ou dependência com tributação favorecida. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), art. 43; Regulamento do Imposto de Renda, anexo ao Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018 (RIR/2018), art. 744, caput e §1º.
Desde o final da década de noventa, essas operações eram isentas com base no Regulamento do Imposto de Renda (RIR) de 1999. Contudo, o novo regulamento, decreto 9.580/18, revogou o artigo 690 da norma anterior, que previa a não retenção de imposto no caso de doações.
Para o advogado Dalton Luiz Dallazem, sócio-fundador do escritório Perin & Dallazem Advogados, o critério usado pela Receita Federal na publicação da solução é equivocado.
Ele aponta que o fundamento tem como base o artigo 43, inciso II do CTN, que menciona a expressão “proventos de qualquer natureza’’ como passíveis de tributação pelo imposto sobre a renda.
“O entendimento é que ‘renda’ abrange, inclusive, as doações. Entretanto, ‘provento’ sempre foi acolhido no direito brasileiro com o sentido de ‘remuneração’, tanto que a CF/88 o define no artigo 37, inciso XI como ‘espécie remuneratória’, e valores doados não se enquadram como tal.”
Para ele, a interpretação pretendida pela RF para alcançar essas remessas não é a mais adequada. Segundo Dallazem, o anteprojeto do CTN esclarecia que o termo “proventos de qualquer natureza”, foi inserido para abranger as “mais valias” ou “ganhos de capital””, mas não compreendia os ganhos gratuitos, como são denominadas as heranças e doações, cuja competência tributária – desde então – já pertencia aos Estados federados.
O advogado Georgios Anastassiadis, do escritório Gaia Silva Gaede Advogados, também considera a mudança indevida e afirma que ela deve ser combatida pelos contribuintes.
“Isto porque as doações já são, há muito tempo, isentas do imposto de renda (lei 7.713/88), o que vale tanto para donatários residentes no Brasil ou no exterior. Por este motivo, como não houve qualquer alteração na legislação em sentido estrito (emanada do Congresso Nacional) revogando esta isenção, não pode a Receita Federal, a seu bel prazer, alterar o Regulamento do Imposto de Renda e emitir uma resposta a consulta simplesmente “revogando” a isenção para o caso de donatários fora do país, sem qualquer embasamento legal.”
Para ele, a incidência do IR nas doações feitas ao exterior não é constitucional, na medida em que as doações e heranças são de competência exclusiva dos Estados (ITCMD), estando o IR fora de seu campo de incidência tributária.
A advogada Rafaela Lora Franceschetto (FAS Advogados – Focaccia, Amaral Pellon e Lamonica) chama a atenção para outro aspecto. Para ela, a revogação da regra isentiva sobre a remessa de doações a residentes domiciliados no exterior acaba por trazer à tona a inconstitucionalidade da técnica arrecadadora construída na forma da retenção na fonte, “na medida em que esta viola os princípios constitucionais que informam haver ou não renda tributável”.
“O ponto a se questionar diz respeito não propriamente à incidência de imposto de renda sobre a remessa de doações, mas sim à constitucionalidade ou não da regra de retenção na fonte criada pelo legislador brasileiro.”
Em muitas hipóteses, de acordo com a advogada, o imposto de renda retido na fonte possui uma alíquota única, o que viola nitidamente o princípio da progressividade, eis que não há a progressão de alíquotas incidentes sobre as diferentes bases de cálculo. “Em outros casos, como pondera Ricardo Mariz de Oliveira, mesmo existindo uma tabela progressiva das alíquotas cobradas no imposto de renda retido na fonte, a referida progressividade deve ser considerada falsa, eis que aplicada a apenas a alguns fatores do acréscimo patrimonial do contribuinte e não sobre todos durante o período-base estipulado em lei (Fundamentos do Imposto de Renda, São Paulo, Ed. Quartier Latin, p. 269).”
FONTE: Migalhas – publicado em 26 de fevereiro de 2019.